ㅤㅤFoi lançada recentemente pela Folha de S.Paulo uma lista com os 25 melhores livros brasileiros do século XXI e, apesar de ser um recorte do momento, trata-se um convite para a gente repensar a nossa literatura, o nosso país e, principalmente, quem somos. Com uma votação de 100 especialistas, o resultado não é apenas uma coleção de títulos — é um retrato do Brasil que pulsa, que luta, que resiste, que sonha.
ㅤㅤLá no topo, “Um Defeito de Cor” (Ana Maria Gonçalves) e “Torto Arado” (Itamar Vieira Júnior) lembram que a história da escravidão e a voz da negritude não podem mais ser relegadas a rodapés ou notas de rodapé. São narrativas que nos confrontam com o país que insistimos em não ver. Logo depois, “O Avesso da Pele” (Jefferson Tenório) reforça a urgência de falar de racismo estrutural, de famílias negras, de afetos e feridas.
ㅤㅤMas a lista é generosa. Dá espaço para autores de trajetórias diversas, como Geovani Martins, com seu “O Sol na Cabeça”, que faz ecoar as vozes da periferia. Traz também “A Queda do Céu” (Davi Kopenawa & Bruce Albert), que nos coloca diante da cosmovisão indígena, e nos faz entender que a literatura não é só a que se escreve em português padrão.
ㅤㅤA presença feminina é marcante: Conceição Evaristo, Elvira Vigna, Angélica Freitas, Natalia Polesso. Elas nos lembram que a literatura brasileira também é feita por mulheres que escrevem sobre o que querem, como querem, e que não precisam pedir licença para ocupar as estantes.
ㅤㅤNo meio dessa multiplicidade, há espaço para o humor corrosivo de “Pornopopeia” (Reinaldo Moraes), para a busca pessoal de “K. – Relato de uma Busca” (Bernardo Kucinski) e para as experimentações de linguagem, segundo a crítica, que se cruzam com a vida real em “Como se Estivéssemos em Palimpsesto de Putas” (Elvira Vigna).
ㅤㅤOlhando essa lista, é impossível não perceber que o Brasil dos livros é muito maior e mais diverso do que o país das manchetes. Não cabe em rótulos nem em estereótipos. E, mesmo com editoras grandes dominando parte do mercado, editoras independentes, como a Pallas, a Dublinense e outras, estão lá, teimosas, mantendo viva a resistência editorial.
ㅤㅤQue a gente tenha a coragem de ler esse Brasil plural – com seus afetos, dores, alegrias e contradições. Porque é nas histórias que a gente encontra a gente mesmo. Que esse rol de livros nos inspire a ser mais críticos, mais humanos e mais brasileiros — em toda a nossa diversidade.
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